O
universo é composto de leis que determinam como as coisas que
conhecemos são. A lei é, na verdade, uma abstração de uma
condição existente para que algo seja de uma determinada maneira.
Abstraímos, por exemplo, que para termos o que conhecemos como água,
deve-se haver determinada composição de hidrogênio com oxigênio.
Não se adquire água com moléculas de carbono, por exemplo. A lei,
por isso, é uma mera abstração de algo que foi observado como um
padrão. Lei, como se quer definir neste texto, é nada
mais que um padrão. As leis, por sua vez, determinam comportamentos
no tempo e no espaço, de forma que, caso uma variável de um padrão
determinado pela lei seja alterada, haverá alguma conseqüência
sobre o comportamento predeterminado pela lei no tempo e no espaço.
Um exemplo de fácil visualização é a flora e a fauna. Se uma
floresta é devastada, houve uma mudança no padrão do ecossistema,
e a conseqüência natural é que os animais que dependiam da
floresta irão morrer, ou irá haver superpopulação de algumas
espécies (mosquitos, por exemplo) devido o desaparecimento de outras
(sapos e camaleões, por exemplo). Essa nova variável altera o
padrão preexistente, instaurando outro padrão. Pela Lei da
Gravidade, sabemos que há uma enorme diferença entre pular um
degrau de escada e entre pular de um edifício sem pára-quedas. A
existência de leis pressupõe respeito a seus ditames, caso se
queira manter os padrões que elas determinam. Toda lei pressupõe um
dever-ser, que é aferido na lógica de um padrão, cujo desrespeito
impõe uma conseqüência, que estabelece um novo padrão, um novo
equilíbrio. O indivíduo que ignora as leis da física e salta de um
edifício sem pára-quedas, rumo ao chão firme, não pode esperar
sair incólume. Sairá, certamente, muito ferido ou morto, porque o
corpo não suporta tamanho impacto. Se não fosse dessa forma, os
homens seriam como os astronautas no espaço: nada do que conhecemos
existiria, não fosse uma lei da física que nos faz ter os pés
firmes no chão, bem como impede, por conseqüência lógica, que um
homem salte de um edifício sem pára-quedas rumo ao chão, e saia
ileso. As próprias leis humanas seguem a mesma lógica. Ao homicida
a lei impõe determinada pena, com o fim de não se distanciar do
padrão de dever-ser que foi alterado pelo crime, estabelecendo
novamente um equilíbrio próximo do anterior ao alterado. Isso
ocorre porque concebemos como padrão que a vida humana deve ser
preservada. Não houvesse uma lei determinando punição ao homicida,
qualquer um poderia matar quem quisesse. Não haveria ordem, haveria
caos, e no caos nada pode existir. O universo que conhecemos,
portanto, é composto de leis, que estabelecem uma ordem, dentre as
quais existem as leis espirituais.
As
leis espirituais estão intimamente ligadas com a natureza de Deus,
que não pode ser arbitrário consigo mesmo. Embora Deus seja
onipotente, ele não age fora de sua própria natureza, ou seja, ele
não muda. Deus possui uma natureza e seu modo de ser é conforme sua
própria natureza. Um dos elementos mais notáveis da natureza de
Deus é que ele é vida. Deus é o ser não criado, que existe sem
ter origem, pois é a própria origem de todas as coisas. Em Deus, e
por meio de Deus, todas as coisas vieram a existir. A existência da
vida depende de Deus e fora de Deus não há vida. Ou seja, não
existe possibilidade de haver vida fora da Vida, fora de sua matriz,
que é Deus. Seria ilógico e arbitrário, para não dizer
impossível.
Assim
como há vida material, há vida espiritual. Deus nos fez a sua
imagem e semelhança e colocou em nós a eternidade, sem que nós
pudéssemos descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até o
fim (Eclesiastes 3.11). É a eternidade que nos diferencia de todos
os outros seres vivos. O homem é dotado de responsabilidade moral,
suas capacidades singulares apenas existem porque Deus fez o homem
diferente dos demais seres, fez o homem com um elo perpétuo com seu
criador. O homem não é fruto do acaso, pois caso fosse, seria, no
máximo, como um animal qualquer, e não teria os atributos
que possui. O homem não é o mero topo de uma evolução, alguém
que se descobriu sozinho no universo, um ser vivo qualquer cuja única
finalidade absoluta de existir é um dia morrer, e ser como se nunca
tivesse sido. Sem Deus, a existência do homem seria sem sentido
absoluto, a vida seria uma mera passagem, onde o homem resolve lhe
dar algum sentido relativo, pois enquanto sentido absoluto sabe que
seu destino final é a morte. De nada valeria o amor, o altruísmo e
o sacrifício pelo próximo. Afinal, assim como a vida, tudo
terminaria e seria como se nunca tivesse sido, logo, tudo seria em
vão. Conceber o homem sem Deus não é apenas de um pessimismo
fatalista, mas ilógico e incompatível com a natureza humana. Uma
falha na leitura sobre a vida, um conceito ilógico sobre a mesma.
Seria o mesmo que concebêssemos a existência da lei da gravidade
onde pular de um edifício sem pára-quedas fosse o mesmo que pular
de um degrau de escada. Isso, em absoluto, não faz sentido. São
coisas mutuamente contraditórias. E nesse sentido, o Apóstolo Paulo
avalia o homem que nega a Deus como indesculpável, visto que a
própria natureza testifica sobre Deus (Romanos 1.20).
Deus
colocou em nós a eternidade, mas apesar disso, a vida depende de
Deus, pois apenas Nele é que há a concretização do elo (Deus e o
homem) preexistente. Deus é como a árvore da vida, nela brotam
ramos de vida, mas não se concebe que a vida possa brotar fora de
sua respectiva árvore. A vida não pode brotar ao léu, de forma
avulsa e independente. Como um ramo da árvore da vida, ela apenas
pode brotar na árvore da vida. Desta forma, assim como há vida,
cujo conceito impõe um termo final, que é a morte, há vida eterna,
cujo conceito não impõe qualquer termo final, pois é eterna, que
por sua vez impõe o conceito de morte eterna, que é a separação
perpétua de Deus, pois Deus é a Vida em sentido absoluto.
A
morte eterna só existe para aqueles que possuem em si a eternidade,
sendo este o caso do ser humano. Em virtude da eternidade presente no
homem, a existência da morte eterna é lógica e pressupõe,
necessariamente, a existência da vida eterna, assim como a
existência da vida pressupõe a existência da morte.
E a morte eterna, a separação perpétua de Deus, é o que
conhecemos como inferno. Ninguém pode afirmar como é, literalmente,
o inferno, mas talvez tudo que se tenha descrito sobre o inferno seja
uma alegoria de uma situação espiritual muito além da compreensão.
Analisando logicamente, o inferno parece ser uma condição
espiritual de vazio eterno, de sede insaciável (não à toa Cristo
disse ser a água da vida), de desejos ardentes mundanos (o fogo) que
nunca mais poderão ser saciados (visto que a vida acabou) e de
sentimentos detestáveis que nunca acabam, visto que no inferno não
há amor, não há vida, não há paz. O inferno é a condição
espiritual de dor, morte e agonia. O inferno é a continuidade da
consciência apartada de Deus.
Certamente
Deus não criou o homem para a morte eterna, mas para a vida eterna.
Quando Deus criou o homem para a vida eterna, por óbvio,
pressupõe-se a existência também de uma morte eterna. A morte
eterna ocorreu quando se acrescentou ao padrão que nos levaria a
vida, o pecado. O pecado alterou o padrão existente e gerou um novo,
qual seja: a morte. Se entendermos tal coisa, fica claro que Deus não
poderia nos criar como somos de outra forma, senão da maneira que
somos. Se não houvesse morte eterna, não haveria vida eterna, o que
nos faria concluir que Deus não teria colocado em nós a eternidade
e, por conseguinte, não seríamos a humanidade como conhecemos, mas
seríamos, no máximo, como os animais irracionais, que nascem com o
sentido absoluto de um dia morrerem, sem sequer se darem
conta disso. Deus não é arbitrário no seu modo de ser, mas
fez todas as coisas com grande coerência, que muitas vezes não
podemos entender, mas podemos abstrair da realidade.
E
o que gera a morte eterna? A morte eterna é gerada pelo pecado,
que é nada mais nada menos do que qualquer coisa que nos afasta de
Deus. Deus, possuindo uma natureza, não pode se aproximar do homem
se este possui natureza diversa da sua. A natureza de Deus é
perfeita, e a isso chamamos de santo. Deus é Santo porque é
perfeito, e a perfeição não se une a imperfeição, pois o
perfeito deixaria então de ser perfeito. E como Deus não pode mudar
sua natureza, que é perfeita, o homem, ao pecar, afasta-se dele, e
seu fim é a morte, não apenas física, mas espiritual.
O
pecado, por sua vez, corrompeu a natureza do homem de tal forma que o
fim do homem espiritual, assim como o carnal, passou a ser,
necessariamente, a morte. O homem, a criação de Deus, concebido
para a vida eterna, precipitou-se no pecado e na morte eterna, sendo
que tais conseqüências são inerentes à natureza de Deus, que é
perfeito e imutável. A morte eterna, como contrário da vida eterna,
não pode ser extinta por Deus, pois tal coisa não estaria em
conformidade com sua natureza, e, conforme visto, isso mudaria tudo o
que conhecemos, ou seja, sequer existiríamos como raça humana. Se
uma coisa que existe é de uma forma, é porque (provavelmente) não
poderia existir de outra forma.
Contudo,
Deus amou a humanidade de tal maneira que, sabendo da possibilidade
de morte eterna para o homem, planejou o conserto antes mesmo da
criação do homem, a única maneira de prover ao homem decaído a
vida eterna, e essa maneira foi se fazendo homem, à semelhança do
pecado (mas sem pecado).
A
morte espiritual entrou no mundo por meio do primeiro homem, que
representa toda a espécie humana. A morte passou a ser uma condição
humana, um estado padrão que foi determinado como conseqüência
pelo pecado. Logo, a conseqüência do pecado, irremediável, era a
morte de tudo o que nasceu da carne, a morte do homem, a separação
perpétua de Deus. Mas Deus, que não muda, não ignorou, em sua
onipotência, a conseqüência do pecado, e se fazendo carne na
pessoa de Jesus Cristo, veio cumprir a conseqüência do pecado, que
era morrer. Cristo, portanto, nasceu para morrer na condição
de homem.
Mas por que o próprio Deus, que é perfeito, se fez homem e
morreu, sendo que nunca pecou, e sendo que a morte para o homem foi
uma conseqüência do pecado? Aqui está a grande maravilha do
sacrifício de Cristo.
Pode
Deus, fonte da Vida, vir a morrer? Encarnando, e apenas
encarnado, Deus pôde morrer, mas na qualidade de Deus, a morte não
pôde prevalecer contra o mesmo, visto que ele é a própria vida.
Deus não pode ficar separado de si próprio. Por isso, a
conseqüência de tal ato, singular no universo, foi que Cristo
ressuscitasse, na qualidade de homem glorificado, ou seja, o homem
que rompeu o obstáculo da morte e voltou à vida, de forma
definitiva, visto que ele é a própria vida. Seu corpo humano agora
é o da vida eterna, incorruptível.
Como
tal ato pôde consertar nosso estado de morte? Assim como a
morte entrou na humanidade por meio de um único homem, assim Deus
venceu a morte, por meio de Cristo, humano, sendo que tal vitória
sobre a morte vale para toda a humanidade.
De
que maneira a morte de Cristo vale para todos os homens? Cristo,
morrendo na condição de homem (pois o pecado decretara a morte da
humanidade) cumpriu a conseqüência da lei do pecado, que decretou a
morte ao homem. Dessa forma, se estivermos ligados a Cristo, que
venceu a morte, nenhuma condenação haverá.
E
de que maneira o homem, que ainda é um pecador, pode se ligar a
Cristo? Isto se dá por meio do Espírito Santo de Deus, que por
meio de Cristo, encarnou na forma humana e venceu a morte,
conseqüência do pecado, e por isso pode hoje habitar no corpo de
morte do homem, o convencendo do pecado e do juízo, e lhe imunizando
dos efeitos da morte, visto que é o espírito daquele que venceu a
morte (e por extensão, o pecado) na condição humana. A encarnação
foi a forma que Deus encontrou, dentro de sua própria
natureza, para unir o homem decaído junto dele, santo. Ou seja,
todos os pecados passam a ser irrelevantes diante de Deus se o homem
der ouvidos à voz do Espírito Santo de Deus, que testemunha acerca
de Cristo, permitindo que este Espírito faça morada no homem.
Cristo é o caminho para a vida, pois por meio dele, somos perdoados
de todos os pecados, perdão este que nos une novamente com Deus.
Toda conseqüência do pecado foi sofrida na pessoa de Cristo, que
morreu por nós.
O
perdão é o maior dos gestos de amor, mas só para quem o faz
verdadeiramente com amor, ou seja, só vale para o arrependido.
Quando um marido magoa a esposa, a mágoa gera um distanciamento
entre o casal, que apenas é resolvido com amor, por meio do perdão,
seja expresso em palavras, seja interior, demonstrado com uma atitude
nobre e de carinho. O mero pedir perdão, sem amor, implica que não
houve arrependimento. Com Deus é da mesma maneira, o pecado nos
distancia de Deus, mas o perdão nos une novamente a ele. Sem
arrependimento, o Espírito Santo de Deus não pode habitar no homem.
Para
o pessimista fatalista, Deus, se admitido, o fez para ir para o
inferno. Em sua tolice abissal, ele não compreende que foi feito
para a vida eterna, e que mesmo sendo um pecador, tal fato não o
condena, pois Cristo venceu a morte por todos os homens. Tudo o que
ele precisa fazer é admitir ser pecador e permitir o Espírito Santo
fazer morada em sua vida, lhe imunizando da morte que ainda compõe
sua natureza e lhe ajudando a vencer as limitações que esta mesma
natureza (doravante antiga natureza) decaída, ainda impõe.
Por
isso é que, em Cristo, somos mais que vencedores (Romanos 8.37),
pois mesmo nascidos da carne, que é mortal e corrupta, as
conseqüências desta condição nada mais podem contra aqueles
que já nasceram do espírito. Aqueles que nasceram do
espírito nascem para a incorruptibilidade, mas quem nasceu apenas da
carne não poderá ver o reino de Deus. A nova natureza do homem que
nasceu do Espírito Santo de Deus prevalece sobre a antiga natureza.
O nascido do espírito venceu a morte.